O veganismo não mais nos pertence (2016)
Em uma breve
pesquisa sobre o termo veganismo pela internet, uma miríade de informações nos
surgem. Parte delas é composta por sites expondo o sofrimento dos animais e o
erro ético de explorá-los e escravizá-los (ou seja, veganismo de fato). Outra
parte, cada vez mais comum, é composta por um mar de ignorância sobre o tema.
“Jornalistas” que
escrevem sobre o que não conhecem é o que mais encontramos em nossos meios de
comunicação, sem contar os comentadores crônicos sem formação, estilo de vida
impulsionado pelo crescimento da presença de redes sociais, blogs, vlogs e
sites de vídeos pessoais.
Algo que me
surpreendeu em uma recente pesquisa sobre o termo pela internet é a quantidade
de sites falando sobre a “dieta vegana” de Beyoncé, artista pop de sucesso mundial.
Veganismo, aí, virou dieta para emagrecimento. Exemplo: “Você sabia que para
usar o polêmico vestido transparente Beyoncé perdeu cerca de 29 kg em 22 dias?
Segundo informações do jornal britânico Daily Mail, todo esse resultado veio de
uma radical dieta vegana”, nos informa uma proveitosa reportagem[1].
Outro artigo
“jornalístico” de valor duvidoso[2]
expôs-me um conceito: veganismo de meio
período, que, diz o título da reportagem, “se populariza com ajuda de celebridades”. Nesse texto, encontramos
pérolas de estupidez pretensamente vegana, apenas mais exemplos da arrogância
humana em sua relação com outras formas de vida, como a campanha Veganuary, que
propõe que pessoas sigam uma “dieta vegana” pelo mês de janeiro. Essa campanha,
nos relata o artigo, “já conseguiu a
adesão de 3,2 mil pessoas à dieta vegana no mês de janeiro, segundo os
organizadores. (...). O mesmo artigo nos relata sobre os “veganos ‘meio-período’”, que “não são contra
o consumo de produtos animais, como ocorre com os veganos tradicionais”.
Veganos que não
são contra o consumo de animais? Como é que chegamos a isso?
Tal
artigo nos brinda com a descrição de alguns motivos para “tornar-se vegano” por
um mês: “alguns querem apenas se livrar dos excessos cometidos no
Natal e Ano Novo, outros querem uma boa desintoxicação”.
O
mesmo artigo traz outras pitadas de desgraça, como: “Há dietas veganas para vários gostos, como a VB6, que defende a dieta
vegana até as 18h e virou moda depois de o articulista de gastronomia
do The New York Times Mark Bittman ter publicado um livro a respeito
em 2013. Também há vários produtos como comida crua, sucos de limpeza, dietas
com sopas que envolvem diminuir o consumo de carne e outros produtos ligados a
animais”.
Onde
está o veganismo nesse veganismo? Onde estão os animais e seus direitos
básicos? Sabemos... nos matadouros, claro.
A postura crítica nascida para nos tirar do centro do
mundo e nos levar a prestarmos atenção aos demais animais tornou-se, em muitas
mentes, mais uma forma de nos colocar no centro. E, pasmem, tal fato é
reiteradamente alardeado e festejado em sites e comunidades veganas em redes
sociais. Veganos, que deveriam ser os
primeiros a manifestar publicamente que veganismo não é dieta para
emagrecimento (e nem mesmo o nome de uma dieta, mas de uma postura ética que
envolve todas as dimensões da vida), divulgam com alegria a pretensa conversão
da estrela rumo ao nobre objetivo de delinear suas curvas corporais e firmar
sua pele.
Como
essa perda do sentido do veganismo se deu? Será que tal popularização do termo
“veganismo” com definições tão diversas do espírito original se deve apenas à
compreensão equivocada por parte de estrelas e jornalistas ou parte da
responsabilidade recai sobre o próprio ativismo vegano?
Diversas vezes, veganos mais confundem que explicam. Unem divulgações sobre a tortura dos animais com dicas alternativas de saúde, dietas estranhas, espiritualidade heterodoxa, socialismo de boteco etc. Confundem as pessoas, que passaram a ver o veganismo como mais um conjunto de esquisitices da moda. A discussão ética e profunda se diluiu e, facilitando para os carnistas, praticamente se anulou. Os veganos têm culpa nessa perda. Sentem-se especiais divulgando todo tipo de maluquice como um pacote no qual o veganismo é um ingrediente.
Muitos veganos são um desserviço ao veganismo. O carnismo agradece.
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